domingo, 2 de fevereiro de 2014

A VERGONHA COMO RECATO E MEIO DE FUGA





Vergonha, medo e orgulho são, portanto, minhas reações originárias, as diversas maneiras pelas quais reconheço o Outro como sujeito fora de alcance...”

Esta é a definição de Sartre- um filósofo contemporâneo francês do século passado- em sua obra magna “O Ser e o Nada”. Bem, quem nunca sentiu vergonha ou presenciou a vergonha de alguém podendo ser alguém em uma situação constrangedora na rua, no colégio, na universidade ou até mesmo um familiar na sua casa? Você certamente tem inúmeras histórias a contar sobre esse tema. As pessoas sempre buscaram se prevenir contra esse sentimento que nos inibe. Você já ouviu alguém dizer ao pé do ouvido de certa pessoa: “cuidado para não passar vergonha... Olha lá o que você vai falar... Aviso de amigo: não saia com essa roupa, pois os outros irão rir...” Uma mãe diz aos outros: “não quero que meu filho passe vergonha”, etc., etc.

Esta é a chamada vergonha fundamental ou de ser objeto: o olhar do outro nos retira da condição de sujeito e nos objetifica, nos torna um mero objeto sujeito a nomeações e também a demonstrar seus diversos caracteres e a pessoa que nos olha age como um sujeito, isto é, como uma pessoa dotada de liberdade reparando outra liberdade objetificada, um Em-si. A vaidade surge justamente neste meio: procuro utilizar o corpo para despertar ou amor ou admiração no Outro. Daí o fato das pessoas irem às inúmeras clínicas de estética para reparar as marcas de idade e amortecer as vergonhas da velhice, não sair com uma roupa velha ou rasgada afim de não causar má-impressão em quem as cerca e optar pelas roupas consideradas “de marca” e não as muito “baratas”. A vaidade é uma pura atitude de má-fé, diz Sartre, visto que eu tento me fazer sujeito e o Outro tento fazer como um objeto de contemplação do meu eu, porém não escapo de ser mera imagem, até ‘requintada’. Vestir-se ou vestir-se de determinado modo, que foi um exemplo que citei, é dissimular a própria objetidade, reclamar o direito de ver sem ser visto, o autor logo antes desse trecho a qual me refiro dá o exemplo bíblico do pecado original e Adão e Eva que logo ao serem tomados pela vergonha um do outro, procuraram formas de se vestir.

Aí justamente se situa a desilusão da vaidade, como põe Sartre no livro: ao constituir o Outro como objeto voltado para a minha ‘beleza’ ou ‘sofisticação’, acabo não saindo de qualquer maneira da condição de imagem em seu âmago. Tentamos fundir uma imagem com o nosso ser e não escapamos da subjetividade do Outro pela influência do seu olhar, daí ser vaidoso ou não tanto faz. Tento me completar ao ser esvaziado da subjetividade pelo olhar da pessoa, mas não dispenso jamais a minha suscetibilidade à vergonha. É matar a galinha dos ovos de ouro, disse Sartre.

E você: qual a sua posição? Você enxerga quais pontos positivos e negativos na vergonha- nada mais nada menos que um fator psicológico. Você acha a vaidade uma ilusão? Se não, qual a sua objeção? Pois apesar de ser uma ilusão, ela, de fato, é nossa necessidade, uma necessidade humana. 

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